Revista Ampla - Ediçãom 30 - page 19

R e v i s ta A m p l a
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Ampla
O que levou a elaboração
de um projeto de lei que define o Ato
Médico?
Alexandre Bley
O Conselho Fe-
deral de Medicina iniciou um proces-
so de discussão sobre o ato médico
no final da década de 90, culminando
com uma resolução editada em 2001.
A principal motivação foi a necessi-
dade de haver uma melhor definição
das atividades profissionais típicas e
privativas de cada categoria profis-
sional, dos limites de cada uma, das
relações entre as atividades limítro-
fes e das relações de cada uma delas
com a Medicina. Na sequência, o
Congresso Nacional iniciou com
um projeto de lei para regula-
mentar a profissão, sendo cha-
mado de Ato Médico.
Ampla
Afinal, qual é o traba-
lho do médico?
Alexandre Bley
Na realida-
de, a população reconhece o que
é um médico e sabe quais são suas
competências. O diagnóstico e a
terapêutica são dois pilares da
arte médica e estão querendo
corromper. Se formos analisar his-
toricamente, as demais profissões
em saúde derivaram de conceitos
da Medicina e em suas compe-
tências, deveriam originalmente
auxiliar o médico no cuidado dos
doentes.
Ampla
Em sua opinião, por-
que diversos profissionais da área
de saúde se manifestaram contra
a aprovação da lei?
Alexandre Bley
A polêmica
da Lei do Ato Médico é que mui-
tas profissões começaram a extra-
polar suas competências e invadiram
a Medicina, justificado por não ter-
mos uma lei que nos regulamente. O
judiciário estava fazendo o papel de
barrar essa invasão, por isso a necessi-
dade de se fazer uma lei. Foi também
uma questão de briga de mercado.
As outras profissões viram ao longo
do tempo oportunidade de expandir
áreas de atuação. São fisioterapeutas
fazendo procedimentos estéticos inva-
sivos ou não, farmacêuticos querendo
prescrever medicação, enfermeiro
fazendo consulta no lugar de médico,
psicólogo querendo prescrever medi-
camentos psicoativos, enfim, se for-
mos analisar não existe preocupação
com o paciente.
Ampla
O Conselho de Medicina
defende a lei do Ato Médico no modo
como está escrita?
Alexandre Bley
Em minha opi-
nião, foram feitas muitas concessões
e o texto atual não reflete o original,
mas sim uma negociação ocorrida no
congresso nos 12 anos de tramitação.
O diagnóstico e a terapêutica, em seus
mais variados níveis, deveriam ser pri-
vativos do médico, pois ele tem maior
bagagem de conhecimento para tal.
Como exemplo, no texto atual se fa-
tiou o diagnóstico em várias partes,
abrindo um precedente perigoso, es-
pecialmente no campo de perícia em
saúde, da mesma forma se desqualifi-
cou o exame citopatológico.
Ampla
Quais os principais pontos
e os mais polêmicos da lei e por quê?
Alexandre Bley
A polêmica está
no sentido de que outras profissões
querem se igualar ao trabalho do mé-
dico. Que fique claro que não somos
melhores ou piores que outros profis-
sionais, mas sim estamos falando de
competência técnica e conhecimento.
A quem cabe diagnosticar e tratar as
pessoas? Se você perguntar para a po-
pulação, ela lhe responderá na hora, o
médico. Novamente, insisto que o pa-
ciente, elemento central na discussão,
foi deixado de lado e as regras de mer-
cado assumiram o controle do tema.
Ampla
A lei trará que tipo de be-
nefícios e mudanças para os médicos e
pacientes?
Alexandre Bley
Para os médicos,
muito pouco, pois nós não avançamos
em nada do que já é nosso de fato.
Pelo contrário, como disse anterior-
mente, algumas concessões des-
virtuaram o projeto. O principal
impacto é tentar conter o avanço
existente sobre a Medicina, im-
portante para o paciente, pois ele
merece que o melhor profissional
lhe atenda. Não acredito que te-
remos grandes mudanças, pois o
discernimento da ampla maioria
dos profissionais da saúde e as
medidas judiciais já estavam se-
gurando as ações de alguns gesto-
res e profissionais.
Ampla
Em sua opinião, algu-
ma profissão será penalizada com
a aprovação do projeto?
Alexandre Bley
A única que
está sendo penalizada é a Medici-
na, devido às concessões impostas
no projeto. Na verdade, se cada
profissão atuasse nos seus limites
de conhecimento, nada disso seria
necessário. É uma pena que as pes-
soas sejam postas de lado e a busca
pela expansão de um mercado de
trabalho seja o pano de fundo da
reclamação das outras profissões.
Ampla
Limitar a ação de outros
profissionais de saúde em alguns pro-
cedimentos pode prejudicar o sistema
público?
Alexandre Bley
O que não pode-
mos concordar é que alguns pacientes,
especialmente os mais pobres e que
necessitam exclusivamente do SUS,
possam ser tratados por enfermeiros e
quem pode pagar, por médicos. Somos
uma única nação com um único povo,
ou não? Isso é uma questão de dignida-
de humana, todos devem ter acesso a
um médico. O governo insiste em des-
viar a sua responsabilidade na saúde,
justificando em cima dos médicos.
"A quem cabe
diagnosticar
e tratar as
pessoas? Se
você perguntar
para a
população, ela
lhe responderá
na hora, o
médico."
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