Pensar Unimed
| Outubro de 2016 - 9
cem, os limites entre o que é
nosso e o que é dos outros,
logo, entre o que é certo e o
que é errado.
E por falar em limites, aqui
pode estar uma pista para
o agravo que vivemos hoje.
“Nós, pais e professores, co-
meçamos a abrir mão do de-
ver de educar, a criança não
tem mais limites”, constata
Karnal, para completar com
a sentença, “ao contrário do
que me ensinaram meus pais,
o crime compensa... mas não
compensa pra sempre!”.
Se, por um lado, a existên-
cia dos corruptos de carteiri-
nha – e aqui entra furar a fila e
lavar dinheiro – parece correr
desimpedida, livre de proble-
mas, o professor garante que
“viver sem ética produz uma
vida tumultuada”. Para ilus-
trar a afirmação, dá o exemplo
do cônjuge que trai seu par,
que vive em sobressalto e que
nem para tomar banho pode
abandonar o celular.
A ÉTICA, ENFIM
“A vida ética é mais tran-
quila”, proclama Karnal, para
alento da, a essa altura, tal-
vez descrente e exaspera-
da plateia. E ele engrossa o
caldo: “o primeiro benefício
da vida ética é ter amigos;
gente ruim e do mal não tem
amigos, tem cúmplices, por-
que nunca se sabe quando a
pessoa vai fazer uma delação
premiada”.
Além disso, ética produz
justa indignação, para enfren-
tar problemas. Nesse ponto,
ele faz duas ressalvas.
Por um lado, é preciso
saber que batalhas escolher.
Temos que brigar eticamen-
te, mas por poucas coisas,
que valham a pena. “Briga-
mos por bobagem – como por
desentendimentos no trânsi-
to – e brigamos muito pouco
por questões como a violên-
cia”, lamenta. Por outro lado,
é preciso restaurar o que ele
chama de “pequena” ou “mi-
croética”, aquela dos eventos
do cotidiano, como andar no
acostamento e emitir reci-
bo falso. “Claro que é muito
mais grave roubar a merenda
de escola pública que andar
no acostamento, mas essa é
uma escada”, a pequena éti-
ca progride até as grandes
questões.
Karnal fecha o ciclo do
seu raciocínio, retomando
a sua tese de que o estado
é um espalho da sociedade,
e dispara: “eu vejo muito
mais esperança nas empre-
sas e escolas que promo-
vem seminários como esse,
e nas famílias, do que num
estado que vai se transfor-
mar como efeito colateral
de tudo isso”. Na sequência,
e num só fôlego, reivindica
que a sociedade não pode
ter gente especial em rela-
ção à lei e que tem que se
basear numa noção repu-
blicana de isonomia, “para
que nenhum idiota nunca
mais diga que a culpa é da
mulher estuprada”, brada.
“Temos que acabar com
esse peso do macho alfa,
que só vale na sociedade
dos leões”.
E, como se abrandasse o
discurso inflamado, conclui
com uma citação do filóso-
fo francês Luc Ferry, de que
sempre haverá problemas,
mas a vida ética é a vida vá-
lida, a vida que vale a pena,
que transforma as pessoas.
“Se eu cumprir as normas
éticas, ao final, garanto, se-
não o paraíso, pelo menos
que se evite o inferno”.
Foto: Mathias
Cramer /
Tempo Real